Meio Ambiente


Haitianos revivem no Acre

a miséria de um país


Por , 15/04/2013 10:33

Pablo Pereira, enviado especial a Brasileia (AC) – Estadão

Foto: Filipe Araujo - ESTADAO
Cerca de 1,3 mil refugiados vivem em situação precária 
e disputam a escassa comida

A disputa no braço por uma quentinha no começo das tardes de quinta e sexta-feira dentro de um galpão na periferia de Brasileia, no Acre, era o reflexo de uma tragédia humanitária que começou em janeiro de 2010 no Haiti e chegou ao Brasil com força dias atrás pela fronteira com o Peru. Passados três anos do terremoto que devastou o país caribenho, 1,3 mil refugiados haitianos lotam um acampamento, passam horas deitados em colchões, sobre placas de papelão, à espera de uma autorização para ingressar oficialmente no território brasileiro. A esse contingente somaram-se nos últimos dias 69 senegaleses, dois nigerianos e até um indiano.
“Perdemos o controle da situação”, admitiu no final da tarde calorenta de sexta-feira o secretário de Direitos Humanos do Acre, Nilson Mourão. Diante do aumento no volume de imigrantes nos últimos 25 dias, o local que abrigava 250 pessoas recebeu pelo menos mais mil viajantes. Só entre quinta e sexta-feira, 50 pessoas desembarcaram de táxis e ônibus com suas malas e a esperança de carimbar documentos que lhes permitam viver legalmente no Brasil.
Vendo que a situação se agravara, o governador do Acre, Tião Viana (PT), decretou situação de emergência humanitária na quarta-feira para atrair atenção de órgãos federais de apoio. Assessores de Viana afirmam que o Itamaraty vem ignorando a situação dos haitianos e deixando para o Estado a administração do problema migratório.
A iniciativa do governador deu resultado. Uma força-tarefa da burocracia federal, composta por diversos ministérios e órgãos federais, baixou em Brasileia na tarde de sexta-feira para tentar aliviar a pressão no município, que possui cerca de 25 mil habitantes.
Enquanto as autoridades brasileiras se envolvem em uma retórica burocrática, os imigrantes sofrem com as precárias condições do alojamento de Brasileia. O principal problema é o tempo de demora para a concessão dos papéis necessários para que oficializem sua condição de refugiados. A delegacia da Polícia Federal existente em Epitaciolândia – cidade vizinha, de 15 mil habitantes – estava preparada para atender 30 pessoas por dia nos últimos meses. Com a avalanche de pedidos e o decreto de emergência, tenta agora acelerar os processos com o reforço de funcionários da Receita Federal, responsável pela concessão de CPFs. A promessa é emitir uma centena de documentos e aliviar a pressão em um mês, permitindo aos imigrantes a obtenção de documentos para a posterior retirada da carteira de trabalho especial, em Rio Branco. Sem a documentação, empresas interessadas em contratar os haitianos não conseguem completar a seleção dos trabalhadores.
“As companhias chegam para buscar gente mas ainda não temos os documentos na mão”, disse Jonathan Philisten, de 40 anos, que deixou quatro filhos em Porto Príncipe para se aventurar pelo Brasil. Falando em espanhol, o haitiano contou que deixou seu país porque queria ir “para qualquer lugar onde tenha trabalho”. Ao lado dele, Elias Ribas, 24 anos, da República Dominicana, apontava para a mulher, Julissa, da mesma idade. “Ela está grávida de cinco meses”, ressaltou. “Queremos ir para Rio.” Cozinheiro, ele acredita que pode encontrar trabalho para recomeçar a vida longe da terra natal. Seguindo a onda dos haitianos, Ribas reclamou da falta de água no reservatório, instalado ao lado do galpão – que às 14h de sexta-feira estava seco. Pouco depois, uma camionete chegou com galões de 20 litros de água, vendidos ao governo por R$ 4,50 e fornecidos todos os dias por um posto de combustível da região.
O indiano Abdul Hoqui enfrentava ainda com esperança a rotina de espera. “Estou aqui há um mês e três dias”, disse. Apesar da dura realidade, o nigeriano Sunday Gbesinmi Ebietomere, de 41 anos, ex-funcionário de um aeroporto de seu país, considera o Brasil a esperança para uma vida nova.
É o que deseja também o haitiano Servil Compere, de 26 anos, que chegou no último dia 5 em busca de um irmão que já trabalha em Santa Catarina. Para ele, um emprego significa um recomeço sonhado há meses. Servil contou que foi salva-vidas em Porto Príncipe, antes do terremoto. Encostado em uma árvore, olhava o tumulto da distribuição de comida. “Eu trabalhava na Defesa Civil”, dizia, enquanto exibia uma carta de recomendação, escrita em espanhol, atestando suas habilidades e com o número do passaporte. Compere espera que seus documentos sejam liberados para que possa procurar o irmão, Villaduin, que está vivendo na cidade catarinense de Porto Belo.
Depois de passar a tarde perambulando pela cidade, percorrendo a pé cerca de 3 quilômetros entre o abrigo de Brasileia e a Rua Santos Dumont, em Epitaciolândia – onde fica a Delegacia da PF – já era noite quando Jonathan Philisten recebeu uma boa notícia. Sua jornada de imigrante não documentado, morador do abrigo de refugiados, seria trocada por uma viagem de cerca de 4 mil quilômetros até a região de Maringá, no Paraná, para trabalhar em uma granja de frangos.
Matéria enviada por José Carlos para Combate Racismo Ambiental.
acesse também no Face.



Imigrantes convivem com lixo 

e mau cheiro em abrigo no Acre



Por , 12/04/2013 10:46
Abrigos no Acre estão lotados de imigrantes, a maioria haitianos, mas também há africanos

Fábio Pontes
Da BBC Brasil, em Brasileia (AC)
Não há mais espaço para colocar colchões no galpão que abriga imigrantes haitianos e africanos, sob um calor de 40ºC em Brasileia, no Acre. Tendas estão sendo instaladas do lado de fora, onde os ‘moradores temporários’ costumam fazer suas necessidades –devido à falta de banheiros. A água, os dejetos e o lixo se misturam formando um esgoto a céu aberto.
O aumento do fluxo de imigrantes para o Acre nos últimos 30 dias fez com que um abrigo de 200 vagas virasse moradia para um número de pessoas que varia entre 1.100 e 1.300. O governador Tião Viana declarou estado de emergência.
A maioria dos imigrantes são haitianos, mas também há cerca de 70 senegaleses, 10 dominicanos e alguns cidadãos da Nigéria e de Bangladesh. De acordo com o governo local, 2.700 imigrantes cruzaram a fronteira neste ano. Cerca de 1.600 deles foram encaminhados pelas autoridades para postos de trabalho em outros Estados brasileiros, mas o restante permanece no abrigo.
Colchões e as bagagens se espalham em cada metro quadrado do galpão que já foi sede de um clube de futebol local e hoje funciona como abrigo. “Nós até possuímos mais colchões, mas não há espaço para colocar”, disse à BBC Brasil o secretário de Justiça e Direitos Humanos, Nilson Mourão.
A água potável é colocada numa caixa d’água transformada em bebedouro. Cerca de 500 litros são consumidos diariamente. No amplo terreno são estendidos varais para colocar as roupas. Um pouco mais longe, quase na calçada, os sacos de lixo se acumulam.
Segundo informações da direção do hospital de Brasileia, há quatro casos de Aids confirmado entre os imigrantes e 20 mulheres grávidas.
A população de Brasileia começa a se impacientar com a presença dos estrangeiros e a pedir providências. Eles reclamam que a falta de banheiros leva os imigrantes a fazerem suas necessidades em qualquer lugar.
Em um quiosque de um parque usado para caminhadas e atividades esportivas o mau odor é insuportável. Com medo, a comunidade deixou de usar o parque. Sem opções do que fazer, os estrangeiros passam o dia a perambular pelas ruas e praças das duas cidades. Os moradores agora evitam deixar mulheres e filhas andar sozinhas pela cidade.
O bancário aposentado Eli Freitas mora atrás do abrigo e se queixa da situação. ”Minha família pode estar aqui fora, minha mulher, minhas crianças, que eles usam isso aqui (apontando para um terreno baldio), como se estivessem num banheiro público. Amanhã, quem mora nas imediações, pode adoecer, com certeza”, afirma.

População de Brasileia começa a se impacientar com a presença de estrangeiros e pedir providência

Rota

O governo acreano e a Polícia Federal passam a investigar a atuação de quadrilhas de traficantes de pessoas na região. Acredita-se que tenha sido a atuação dessas quadrilhas de traficantes de seres humanos que incentivou a chegada de imigrantes.
A rota para se chegar ao Brasil é extenuante. O caminho usado pelos imigrantes haitianos tem início ainda na capital do Haiti, Porto Príncipe. De lá, eles voam para o Panamá e então para o Equador, onde completam a jornada por terra, com destino ao Peru ou à Bolívia, de onde partem em direção à fronteira do Acre.
Já a jornada dos imigrantes africanos e asiáticos é ainda mais árdua. Os africanos partem ou do Senegal ou do Marrocos e seguem para a Espanha. De lá rumam para o Equador e completam a jornada realizando um trajeto semelhante ao dos haitianos. Muitos chegam a pagar mais de R$ 3.000 aos chamados coiotes.

Força-tarefa

Nos últimos anos, o Brasil já recebeu cerca de 6.000 haitianos. Por emigrarem por motivos econômicos, o Comitê Nacional para os Refugiados do Ministério da Justiça (Conare) entende que eles não têm direito a receber o status de refugiados. Na maioria dos casos, porém, esses estrangeiros recebem um visto para residir e trabalhar no Brasil por razões humanitárias, o que lhes permite refazer a vida no país.
Alarmado pelos apelos do Acre, na quarta-feira o Ministério da Justiça anunciou a criação de uma força-tarefa para agilizar a concessão de vistos temporários para esses imigrantes e a emissão de carteiras de trabalho.
”O Ministério da Justiça e o Ministério do Trabalho vão fazer um mutirão, tanto da Polícia Federal quanto de agentes do Ministério do Trabalho, para que nós consigamos emitir protocolos que autorizem esses haitianos a terem visto no Brasil e ao mesmo tempo se possa emitir carteira de trabalho, para que eles possam trabalhar”, disse, em entrevista, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo.
”Nós estamos discutindo medidas que coíbam essa situação de entrada ilegal no Brasil incentivada por coiotes, organizações criminosas que se valem da miséria e do desespero de haitianos pra conseguir colocá-los ilegalmente dentro do país. E a melhor maneira de fazer isto é ampliar a possibilidade de que legalmente haitianos entrem no Brasil”.
-
Enviada por José Carlos para Combate Racismo Ambiental.


acesse também no Face.



Chamamos de Racismo Ambiental às injustiças sociais e ambientais que recaem de forma implacável sobre grupos étnicos vulnerabilizados e sobre outras comunidades, discriminadas por sua 'raça', origem ou cor”. /// "Llamamos Racismo Ambiental a las injusticias sociales y ambientales que recaen de forma implacable sobre grupos étnicos tornados vulnerables y sobre otras comunidades, discriminadas por su 'raza', origen o color".


Nenhum comentário:

Postar um comentário